domingo, 28 de fevereiro de 2016

Borragem


Quase a terminar o mês e depois de um fim-de-semana fustigados por uma frente fria, como já não sentíamos há anos, relembramos hoje mais uma espécie silvestre autóctone e que já está em floração em muitos sítios. E que nos recorda que, por muito duros que sejam estes dias, a Primavera se aproxima inexoravelmente.

Um alento para os mais incrédulos, mas não só. A borragem é planta para vários fins, a começar pelo seu lado estético. As suas flores em formato de estrela, de singulares tons azuis, são além de inegavelmente bonitas, comestíveis podendo ser utilizadas em saladas seja pelo elemento decorativo seja pelo seu travo picante.

Mas não são só as flores que são comestíveis. As suas folhas enquanto jovens entram bem em saladas e depois disso, se maduras e mais rugosas, têm em infusão diversas aplicações fitoterapêuticas , sendo indicadas no combate a bronquites, resfriamento e tosse.

Dos muitos usos que é possível dar á borragem, e que é possível descobrir em diversos livros e publicações, fazemos ainda referência a um que Miguel Boieiro partilha no seu livro "Plantas para curar e comer" num texto dedicado a esta espécie:  o de cataplasma  como máscara de limpeza da pele, ao jeito dos feitos com pepino e iguais resultados ao limpar e tonificar a pele.

De notar por fim que é uma planta melífera, muito apreciada pelas abelhas que têm no seu néctar um dos primeiros alimentos frescos do ano!

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2016

Capuchinhas


Nem só de flora autóctone se fazem as sementes de Portugal. E nessa perspectiva, apesar da nossa preferência pelo que evoluiu naturalmente no nosso território, gostamos também de outras espécies que sendo oriundas de outras latitudes há muito que foram introduzidas tendo-se assilvestrado um pouco por todo o país.

Esta é uma questão que suscita discussões apaixonadas e para muitos, não sendo "nossa" deveria ser irradiada e proscrita. Mas na nossa perspectiva esse não pode ser o caminho. É certo que a introdução de espécies de outras paragens podem causar graves problemas ambientais pelo seu comportamento invasor - veja-se o exemplo das acácias em muitas das nossas serras. Mas pretender um regresso ao paraíso original seria, no limite do absurdo, tentar anular os efeitos de milhares de anos de migrações humanas.

E se hoje em dia metade da alimentação humana se faz com alimentos provenientes de todos os cantos do mundo porque não tirar partido de uma espécie que se assilvestrou e que, por acaso, até tem inegáveis qualidades e aplicações diversas?

Das várias espécies que estão nestas condições, destacamos as capuchinhas (Tropaeolum majus). Ou chagas, como também são conhecidas ou agrião de jardim como é denominada pelos ingleses. 

Mais não fosse pelo colorido das suas flores, de várias matizes de amarelo, laranja e vermelho, razões não faltam para se querer ter esta planta por perto. As que destacamos  hoje é a possibilidade de utilizar as suas pétalas em saladas. Além de decorativas possuem um característico travo amargo, próximo do sabor a agrião, e  com elevados teores de vitamina C.

Mas há outras aplicações. As folhas mais jovens também são comestíveis e as próprias sementes, se colhidas jovens e maceradas em vinagre, são uns bons pickles!

Referência por fim às aplicações medicinais que, de acordo com Miguel Boieiro no seu livro "Plantas para curar e para comer", são mais que muitas indo desde a sua acção antibiótica. activadora da circulação sanguínea, desinfectante, fungicida, entre outras.

Sobre as condições necessárias que requer para prosperar de notar apenas, como referíamos AQUI, que gosta de solos bem húmidos, drenados e expostos ao sol. Dando-lhe isto não são precisos mais cuidados e é possível ter capuchinhas à mão seja na varanda, num vaso ou no quintal.

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2016

Cardo mariano e Preconceito


Uma nova semana e uma nova espécie para evidenciar. E voltamos a mais um cardo. O cardo-mariano.

Quem nos segue há pouco tempo já deve ter pressentindo a nossa predilecção por cardos. Tem razão para o pensar. Numa certa perspectiva as plantas assim designadas estão na nossa flora como os lobos na fauna. Pouca amadas popularmente, recebem o título todas aquelas plantas que desenvolverem espinhos. Deixámos de as reconhecer, mas da fama de más já não se livram.

O que é errado. Desde logo convém voltar a referir que "cardo" não é género botânico, sendo antes uma designação de "agregação popular" para ensacar plantas de géneros e famílias diversas, como, aliás referimos AQUI, possuem os tais espinhos.

O cardo de hoje, Silybum marianum, tem na nossa perspectiva interesse ornamental seja pelas inflorescências seja pelas enormes folhas verde matizadas de branco. É esteticamente bonito. Mas reconhecemos que pode ser arrojado tê-lo ao pé da porta e os seus espinhos são pouco meigos. Que tem aplicações medicinais também é conhecido - basta passar por uma ervanária, perguntar soluções feitas com os seus extractos e ver a quantidade.

O que é menos conhecido é o seu uso alimentar. E é esse que, por experiência própria recente, vivamente aconselhamos. As suas folhas, robustas, uma vez desprovidas dos pequenos espinhos que possuem na margens, são um bom ingrediente quer em saladas (se as folhas forem jovens) quer incluídas em sopas e a par de outras hortaliças. Mas há até quem faça esparregado com elas. E quem as provar vai quase de certeza ficar a pensar até onde os preconceitos se conseguem estender. Imaginem, até aos cardos. Afinal, inofensivas, deliciosas e sucolentas folhas...




sexta-feira, 19 de fevereiro de 2016

Cardo Penteador


Iniciámos esta semana com uma sugestão improvável - a canafrecha - e terminam-la com outra igualmente insolente: o cardo-penteador. Como é óbvio não somos ortodoxos em matéria de jardinagem e o que é belo não precisa de estar num garden-center com um preço afixado para que tal lhe seja reconhecido.

Acresce a isto que se há boas opções, generalizadamente aceites por todos, uma horta ou um jardim é também um espaço de intimidade que cada um pode personalizar com as espécies que realmente aprecia e não exclusivamente com o que os vizinhos do lado escolheram. Como em tudo, na jardinagem também é possível ser-se ousado!

E ter cardos-penteadores num jardim ultrapassa em muito a ousadia! É esbanjar à porta de casa o que estava à vista de todos e ninguém tinha notado: a inegável beleza geométrica das infloresçências, a engenhosa perfeição das formas que a Natureza apurou nesta planta.

De notar que é uma espécie bi-anual (i.e. as inflorescências emergem apenas no segundo ano do seu ciclo de vida) e que tendo preferência por solos encharcados de Invernos não requisita quaisquer cuidados: Está perfeitamente adaptada ao nosso clima e sabe como dar a volta aos nossos Invernos chuvosos e Verões secos.

Como escrevemos AQUI, esta espécie, que pertence ao género Dipsacus, tem também aplicações medicinais reconhecidas popularmente. Porém, para nós, que nãos as testámos, a grande  mais-valia é ecológica e estética. Seja enquanto está viva seja depois de seca nos mais diversos arranjos.


segunda-feira, 15 de fevereiro de 2016

Canafrecha



Depois de nas últimas entradas termos passado em revista alguns dos (muitos)  arbustos essenciais a ter por perto, e que de uma maneira ou de outra, já têm créditos reconhecidos em matéria de jardinagem, arriscamos-nos hoje a evidenciar as qualidades de uma espécie herbácea que, embora tenha inegáveis qualidades estéticas, é incompreensivelmente  ignorada.

A canafrecha, Ferula communis, que se pode encontrar em praticamente todo o território nacional é simplesmente a maior planta herbácea da nossa flora cujas enormes hastes florais podem atingir cerca de 5 metros. Muito em breve, de Abril a Junho, será possível encontrá-las no horizonte de muitas estradas de província marcando a paisagem com o seu porte arquitectural.

Mas não é preciso esperar pelo surgimento das hastes e das inflorescências para apreciar esta planta num jardim. As suas grandes folhas são, como referíamos AQUI  tão finamente divididas que exibem um vistoso aspecto plumoso. Apesar de os ingleses a apelidarem de "Funcho Gigante" deve ter-se em atenção que as folhas são tóxicas pelo que não devem ser consumidas. De resto, apresenta todas as vantagens da família das apiácias a que pertence, sendo bastante apreciada pelos insectos polinizadores.

Medicinalmente não lhe são conhecidas aplicações tradicionais, mas não resistimos a transcrever um parágrafo que Miguel Boieiro escreveu no seu livro "As Plantas, nossas irmãs" a propósito da sua fama de "favorecer a apetência sexual e de ser ainda melhor que o "Viagra". Para tal macera-se durante 10 dias 50 gr de sementes num litro de vinho tinto e bebe-se um cálice antes das refeições. Será mesmo assim?" . Sem evidencias cientificas e nenhum testemunho vivo, o melhor é mesmo não arriscar!

Uma nota final para a ecologia, referindo que tem preferência por solos calcários, mas não forçosamente (não tolera provavelmente solos ácidos), gosta de de locais temporariamente encharcados no Inverno/Primavera, drenados e com boa exposição solar.

terça-feira, 9 de fevereiro de 2016

Entrar na Quaresma com Pascoinhas


Como este ano quase que passámos por cima do Carnaval, ou Entrudo, se preferirem, aproveitamos o seu terceiro e último dia para voltarmos a uma espécie que já começou a entrar em floração e cujo nome vulgar está associado ao período da Páscoa que agora se inicia: as Pascoinhas.

Mas antes disso, sobretudo para aqueles que tendo o privilégio de assinalar freneticamente o dia de hoje nos mais diversos corsos, não têm presente o porquê de tanta euforia nos inícios de Fevereiro, relembramos que estes 3 dias de excesso são mesmo a última janela de oportunidade que têm antes de entrarmos no período de abstinência e recolhimento que se inicia amanhã, dia 10, Quarta-feira de cinzas e primeiro dia da quaresma.

O facto de ser sempre uma terça-feira, mas em dias diferentes do ano também tem uma justificação e decorre tão só e apenas do facto do Dia de Páscoa também ser um feriado móvel, determinado por uma regra pouco conhecida mas há muito estabelecida: O dia de Páscoa celebra-se em cada ano no primeiro Domingo a seguir à primeira lua cheia que ocorrer após dia 21 de Março (dia convencionado, embora muitas vezes assim não seja, em que ocorre o equinócio da Primavera).

Uma vez identificado esse Domingo ( que neste ano de 2016 será a 27 de Março) andam-se 40 dias para trás (Domingos não contam) e temos com rigor o dia em que deve começar a Quaresma.Como na Quaresma não entram os prazeres da carne, o adeus a esta fica forçosamente confinado aos 3 dias anteriores: este ano dias 7, 8 e 9  - sendo também certo que para muitos há já bons motivos para a folia desde a semana passada.

Curiosamente, e como lembrávamos AQUI no ano passado, a propósito do dia de ramos, é amanhã que se devem queimar os os ramos de oliveira, alecrim, rosmaninho e outras flores primaveris que se fizeram na Páscoa de 2015. É com as cinzas desses ramos que nas celebrações da Igreja católica se dá com rigor início ao período que nos conduzirá à Páscoa.

Dito isto, ficámos com pouco espaço para dar atenção às pascoinhas (Coronilla glauca) que a partir de agora, e seguramente até ao final de Maio, vão cobrir de amarelo muitos dos campos do centro e sul de Portugal. Não lhe são conhecidas aplicações medicinais ou outros usos, mas o seu valor ornamental é tanto que está dispensada disso. AQUI deixamos o link para a entrada que publicámos há quase dois anos sobre este arbusto que faz as delícias de quem nos visita!

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2016

Murta, dois palácios e uma amante


E à oitava espécie que revisitamos, destacamos hoje a Murta. E fazêmo-lo ma vez mais sob suspeita pois dos arbustos da nossa flora nativa é o nosso preferido. Não só por ser uma planta de inegáveis qualidades e poucas exigências, mas sobretudo por ser o exemplo perfeito de uma planta que, outrora profusamente apropriada pelos nossos antepassados, quase caiu no esquecimento, existindo hoje poucos que a consigam identificar de forma imediata.

O que não tem justificação alguma, pois a Murta encontra-se de olhos fechados. Basta ter o nariz atento ao aroma laranja/limonado das suas folhas, as quais, entre outras aplicações, substituem com sucesso as folhas de louro na aromatização dos mais variados pratos. Isto para não falar das aplicações medicinais ou das muitas utilizações que os povos do mediterrâneo deram às suas bagas - os murtinhos, na confecção de licores, por exemplo.

Este arbusto, que pode crescer até aos 3 metros e que se encontra praticamente em todo o centro e sul de Portugal, pode todavia gabar-se que mesmo não sendo conhecido se ostenta todos os dias sem o sabermos em centenas de topónimos: Murteira, Murtão, Murtosa, entre outros, são apenas alguns exemplos que se desmultiplicam seguramente em largas dezenas de localidades do nosso país. Mas isto sendo muito é apenas uma pequeníssima parte.

A Murta era, como tínhamos descoberto AQUI, uma planta sagrada para Gregos e Romanos que a plantavam junto aos templos consagrados a Vénus, simbolizando a Paz, o Amor e a constância. E se isto era transversal a toda a bacia mediterrânica também o foi por cá até bastante tarde.

Atendendo aos resultados de uma pesquisa rápida no google, é seguro afirmar que até aos anos 30 do século XVIII, a Murta ainda era foi nós um reconhecido símbolo de Amor, Pelo menos para D. João V que a D. Luísa Clara de Portugal, aia da rainha e sua amante favorita, não viu melhor cognome do que "Flor da Murta". É sabido que D. João V teve inúmeras amantes, mas a poucas terá escrito o que abaixo transcrevemos copiado da página de FB Lisboa de antigamente, e cuja foto partilhamos:
«Cantiga à Flor da Murta


Oh! Flor da Murta

Raminho de freixo,
Deixar d' amar-te
É que t' eu não deixo.



Morrer sim

Mas deixar-te não.
Oh! Flor da Murta
Amor do meu coração.



Oh! Flor da Murta

Do meu coração,
Deixar d' amar-te
Ai não deixo, não.»



(D. João V, atrib.) 

(Alice Lázaro, «Luísa Clara de Portugal - A Flor da Murta, Biografia (1702-1779)», Chiado Editora, Portugal 2012)
Uma historia apaixonante e que nos legou ainda dois palácios com o nome da Flor da Murta: Um em Lisboa, na R. dos Poços dos Negros e outro, na Terrugem- Oeiras.

 E se o móbil principal deste post  deveria ser o devender sementes de Murta, que as temos frescas e prontas a germinar, compreendemos perfeitamente que existam namorados com urgência em querer celebrar já o próximo dia 14 com uma Murta feita e sem qualquer hipótese de erro de germinação. Para isso nada como contactar com a Flor de Murta, um projecto-viveiro que também se dedica à flora autóctone de Portugal, que lhe tomou o nome e que a elegeu como a planta em promoção no mês de Fevereiro.

Em semente, ou em vaso, o importante é mesmo pois ter (pelo menos) uma Murta por perto e à mão de cheirar!

A Flor de Murta - D.Luisa Clara de Portugal
(Alice Lázaro, «Luísa Clara de Portugal - A Flor da Murta, Biografia (1702-1779)», Chiado Editora, Portugal 2012)

Adenda e correcção - Como é sabido, as "pesquisas na internet" têm os seus perigos em matéria de rigor e podem induzir em erro. E neste texto induzimos num sem o querer. Na realidade a D. Luisa Clara de Portugal não ficou conhecida por a " Flor da Murta" devido ao envolvimento amoroso com D. Joao V mas sim por antes disso ser casada com D. Jorge de Meneses, senhor da Casa de Alconchel, também conhecida como da "Flor da Murta". É essa ao que parece a origem do nome dos dois palácios que tomaram o nome da casa dos seus senhores. O seu envolvimento com D. João V, a par da sua beleza, fazem dessa coincidência com a simbologia da Murta uma história ainda mais deliciosa. Ou trágica, se considerarmos a perspectiva de D. Jorge de Meneses, traído pelo seu rei e pela sua esposa.